quinta-feira, 18 de junho de 2009

Budapeste, de Walter Carvalho

A literatura e o cinema são repletos de personagens em busca de seu semelhante, mais conhecido como duplo, ou, Doppelgänger, ou seja, é a questão da identidade do indivíduo. Se no mundo existe um lugar ideal para alguém procurar a sua metade é Budapeste. Divida Buda e Peste, cortada pelo Rio Danúbio, a cidade é a síntese de um indivíduo dividido entre duas metades.

No longa Budapeste, o protagonista, Costa (Leonardo Medeiros, de Feliz Natal), está divido em dois: vive entre o Rio de Janeiro e Budapeste. Em cada cidade leva uma vida, vive um amor, e é perseguido por seus fantasmas e neuras.

Sua profissão é ghost writer, ou seja, escreve para que os outros levem a fama. E seus livros fazem sucesso, mas quem colhe os louros são aqueles cujos nomes estampam a capa da publicação. Ao fazer uma parada por acaso na Hungria, Costa descobre diversas coisas, como o fato de Budapeste ser amarela, ‘o Húngaro ser a única língua que o diabo respeita’, e a bela Kriska (vivida pela atriz húngara Gabriella Hármori).

Deixando de lado o ensolarado Rio de Janeiro, e se embrenhando em Budapeste que é tão bela quanto fria, Costa começa a aprender húngaro, e se torna o seu duplo, Kósta. No Rio de Janeiro, ficam sua mulher (Giovanna Antonelli, de Caixa Dois) e filho pequeno. Numa festa na Embaixada da Hungria algum húngaro comenta que eles são ‘os cariocas do Leste Europeu’ – o que, no final das contas, facilita a vida para o protagonista.

Com roteiro baseado no romance homônimo de Chico Buarque (que dá sua benção ao filme com uma pequena participação), assinado pela também produtora Rita Buzzar (Olga), Budapeste é um filme que às vezes se deixa seduzir pela beleza de suas imagens – especialmente pelas da cidade húngara – e se deixa levar por uma verborragia descritiva no discurso em off do protagonista. Mas, estranhamente, nada disso, que poderia ser um grande problema, atrapalha o andamento do filme.

A direção é de Walter Carvalho, um dos mais renomados diretores de fotografia (Lavoura Arcaica, Cleópatra) em atividade no Brasil, que co-dirigiu Cazuza – O Tempo Não Para, com Sandra Werneck, Janela da Alma, com João Jardim, e em solo o documentário Moacir Arte Bruta. Talvez por conta disso “Budapeste” é um filme que encontra força nas suas imagens, como uma estátua de Lênin descendo o Rio Danúbio, ou livros escritos nos corpos de mulheres.

O livro de Chico Buarque, lançado em 2004, lida, nas entrelinhas com outra questão: a metalinguagem. Na tela é mais complicado levantar isso de uma hora para outra, mas Carvalho e a roteirista encontram uma saída muito interessante que se revela apenas nas últimas imagens do filme.

“Separar uma palavra da outra é como cortar um rio à faca”, comenta Kósta, se referindo, claro, à Budapeste, mas também pode estar falando de si mesmo, afinal, os duplos se complementam, por isso estamos sempre em busca do nosso Doppelgänger. O filme é a jornada do protagonista em busca de sua identidade, de seu complemento. E, às vezes, precisamos atravessar um oceano para encontrar aquilo que está dentro de nós mesmos.

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