'Corpos Celestes' é uma espécie de óvni no cinema brasileiro -- e isso é um elogio. Numa época em que a mesmice destinada ao consumo em massa tende a imperar, o filme dirigido por Fernando Severo e Marcos Jorge ('Estômago') tenta fazer algo diferente, ser criativo. Se consegue sempre, é outra questão.
Dalton Vigh protagoniza 'Corpos celestes', que entra em cartaz nesta sexta-feira.
Roteirizado pelos diretores em parceria com Carlos Eduardo Magalhães e Mário Lopes, 'Corpos Celestes' parte de dois argumentos para curtas de Jorge, cujo filme anteriormente lançado,'Estômago', conquistou um merecido status de cult com seu humor negro e atores talentosos. Aqui, porém, trabalhando com seu parceiro e amigo Severo, o diretor vai por outra vertente: um filme intimista de tons existencialistas, que transita do drama à fantasia.
Ao centro estão dois momentos da vida de Francisco -- interpretado pelo estreante Rodrigo Cornelsen, na infância; e Dalton Vigh, quando adulto. A frase 'a criança é o pai do homem', tornada célebre por Machado de Assis, serve perfeitamente neste caso, uma vez que, na segunda parte, com o personagem já crescido, reverberam momentos e ações de sua infância. Foi nessa fase que ele entrou em contato com a astronomia, ao conhecer um norte-americano que morava na sua cidadezinha, interpretado por Antar Rohit.
Na trama, astrônomo se envolve com uma prostituta.
Abismo emocional
Os corpos celestes do título funcionam tanto como metáforas, quanto como símbolos. Há a imensidão do céu, a grandeza da vida, a distância entre as estrelas e planetas, o abismo emocional entre Francisco e sua família, a ausência de amigos.
O filme, no entanto, nunca carrega as tintas, não colocando excessiva ênfase em suas metáforas. Ao contrário, a trama vai se abrindo de forma sutil. Embora nem sempre tudo funcione a contento, o lirismo da primeira parte -- que parece dialogar diretamente com o antigo cinema italiano -- é redentor. Assim como o visual, repleto de efeitos especiais que nunca parecem exagerados ou artificiais.
Na segunda parte, quando Francisco mora na cidade grande e é um astrônomo conceituado, fica em evidência o distanciamento emocional do personagem. Ele praticamente não tem amigos, trabalha muito e fala pouco. Essa situação apenas muda quando está com sua amada, Diana (Carolina Holanda), uma prostituta de bom coração, como é comum quando a profissão é retratada no cinema.
A jornada de Francisco vai no sentido de tentar entender a si mesmo, seu lugar no mundo e aceitar aquilo que a vida lhe oferece. Essa tarefa, no entanto, se mostra mais difícil do que desvendar os mistérios do céu, das constelações e das galáxias. Uma coisa, porém, é certa: nada é definitivo, tanto na imensidão do universo, quanto na vida. Afinal, até Plutão foi rebaixado à condição de ser apenas uma estrela, enquanto por muito tempo foi um planeta.
(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)
* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb.
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