sábado, 22 de maio de 2010

Filme narra a trajetória de irmãos que lideraram guerrilha argelina em Paris

Manifestantes da ultradireita francesa protestaram na manhã desta sexta-feira (21) em Cannes contra a exibição do filme "Hors la loi", do diretor franco-argelino Rachid Bouchareb.

Promovido pelo partido Frente Nacional, do qual faz parte Bernand Brochand, prefeito de Cannes, o protesto com cerca de 1.200 pessoas foi contido pela polícia e não chegou ao Palácio dos Festivais, onde acontece a mostra de cinema. Antes do festival, deputados do mesmo partido já haviam criticado o filme por supostamente distorcer os fatos que culminaram com a indendência da Argélia da França em 1962.

Quase 1.200 pessoas se reuniram no centro de Cannes
Quase 1.200 pessoas se reuniram no centro de Cannes.

Do lado de dentro do Grand Theatre Lumière, no entanto, o que se viu foi um grande filme, que independentemente das tintas ideológicas reforça a França na briga pela Palma junto com outro forte candidato do país, "Des hommes et de dieux". De certa forma, o filme de Xavier Beauvois exibido no início da semana, também lida com a tensão nas relações entre a potência europeia e sua antiga colônia ao se inspirar no rapto de seis monges cristãos por terroristas na Argélia nos anos 1990.

"Sei que o passado colonial francês reabre feridas. Mas este passado deve ser debatido para avançarmos rumo a um verdadeiro encontro (entre França e Argélia), para avançarmos para coisas positivas", declarou Bouchareb em entrevista coletiva logo após a exibição do longa.

'Hors la loi' mostra conflitos que precederam independência  da Argélia
'Hors la loi' mostra conflitos que precederam independência da Argélia.

Três irmãos argelinos
"Hors la loi" (foras da lei, numa tradução literal) acompanha a trajetória de três irmãos argelinos que são forçados pelo governo colonial a deixar sua casa quando crianças e, após sobreviverem ao massacre de Setif, em 1945, se reencontram em Paris em meados da década de 1950. O mais velho, Messaoud, se alista no exército francês e é enviado para lutar na Guerra da Indochinha; o irmão do meio, Abdelkader, torna-se preso político e se envolve com o movimento de guerrilha argelino Frente de Libertação Nacional; enquanto Saïd, o caçula e menos afeito a política, acaba construindo uma carreira bem sucedida como dono de clube de strip tease e empresário de boxe.

Assim que Abdelkader é colocado em liberdade e Messaoud retorna da guerra, os irmãos se unem para liderar o crescimento do movimento pré-libertação da Argélia via FLN entre os imigrantes argelinos nas fábricas e favelas de Paris

Bouchareb, que já afirmou que sua obra é uma peça de ficção, retrata Abdelkader como um revolucionário disciplinador e incorruptível, capaz de colocar seus objetivos políticos acima de si próprio e de sua família, e os franceses como vilões absolutos da história. Apesar da força dramática do roteiro, do elenco competente e da cuidadosa direção de arte na reconstituição da época, não é de se estranhar portanto que tal maniqueísmo acabe incomodando ainda muita gente.

"É uma falsificação da história", disse o francês aposentado de 62 anos Frederic Bruno, que participava da manifestação em Cannes e se dizia descontente com a forma como o filme retrata o confronto entre exército francês e argelinos em Setif, em 1945. Segundo ele, o "exército manteve a ordem" e foram os argelinos que começaram a briga, que terminou em um massacre sangrento com baixas dos dois lados.

"O filme não é um campo de batalha", rebateu o diretor na coletiva. "Ele só está lá para dar início a um calmo debate."

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