Manifestantes da ultradireita francesa protestaram na manhã desta sexta-feira (21) em Cannes contra a exibição do filme "Hors la loi", do diretor franco-argelino Rachid Bouchareb.
Promovido pelo partido Frente Nacional, do qual faz parte Bernand Brochand, prefeito de Cannes, o protesto com cerca de 1.200 pessoas foi contido pela polícia e não chegou ao Palácio dos Festivais, onde acontece a mostra de cinema. Antes do festival, deputados do mesmo partido já haviam criticado o filme por supostamente distorcer os fatos que culminaram com a indendência da Argélia da França em 1962.
Quase 1.200 pessoas se reuniram no centro de Cannes.
Do lado de dentro do Grand Theatre Lumière, no entanto, o que se viu foi um grande filme, que independentemente das tintas ideológicas reforça a França na briga pela Palma junto com outro forte candidato do país, "Des hommes et de dieux". De certa forma, o filme de Xavier Beauvois exibido no início da semana, também lida com a tensão nas relações entre a potência europeia e sua antiga colônia ao se inspirar no rapto de seis monges cristãos por terroristas na Argélia nos anos 1990.
"Sei que o passado colonial francês reabre feridas. Mas este passado deve ser debatido para avançarmos rumo a um verdadeiro encontro (entre França e Argélia), para avançarmos para coisas positivas", declarou Bouchareb em entrevista coletiva logo após a exibição do longa.
'Hors la loi' mostra conflitos que precederam independência da Argélia.
Três irmãos argelinos
"Hors la loi" (foras da lei, numa tradução literal) acompanha a trajetória de três irmãos argelinos que são forçados pelo governo colonial a deixar sua casa quando crianças e, após sobreviverem ao massacre de Setif, em 1945, se reencontram em Paris em meados da década de 1950. O mais velho, Messaoud, se alista no exército francês e é enviado para lutar na Guerra da Indochinha; o irmão do meio, Abdelkader, torna-se preso político e se envolve com o movimento de guerrilha argelino Frente de Libertação Nacional; enquanto Saïd, o caçula e menos afeito a política, acaba construindo uma carreira bem sucedida como dono de clube de strip tease e empresário de boxe.
Assim que Abdelkader é colocado em liberdade e Messaoud retorna da guerra, os irmãos se unem para liderar o crescimento do movimento pré-libertação da Argélia via FLN entre os imigrantes argelinos nas fábricas e favelas de Paris
Bouchareb, que já afirmou que sua obra é uma peça de ficção, retrata Abdelkader como um revolucionário disciplinador e incorruptível, capaz de colocar seus objetivos políticos acima de si próprio e de sua família, e os franceses como vilões absolutos da história. Apesar da força dramática do roteiro, do elenco competente e da cuidadosa direção de arte na reconstituição da época, não é de se estranhar portanto que tal maniqueísmo acabe incomodando ainda muita gente.
"É uma falsificação da história", disse o francês aposentado de 62 anos Frederic Bruno, que participava da manifestação em Cannes e se dizia descontente com a forma como o filme retrata o confronto entre exército francês e argelinos em Setif, em 1945. Segundo ele, o "exército manteve a ordem" e foram os argelinos que começaram a briga, que terminou em um massacre sangrento com baixas dos dois lados.
"O filme não é um campo de batalha", rebateu o diretor na coletiva. "Ele só está lá para dar início a um calmo debate."

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